Irmãos aproximamo-nos, trepidantes e repletos de enlevo, do “lugar” onde tudo teve início para nós e para a nossa salvação, onde tudo encontrou um cumprimento, onde se encontraram e se entrelaçaram as expectativas do mundo e do coração humano com a presença de Deus. Já agora podemos antegozar a alegria por aquela luz ténue que se entrevê, que da gruta de Belém começa a irradiar-se no mundo. No caminho do Advento, que a liturgia nos convidou a viver, somos chamados a acolher com disponibilidade e reconhecimento o grande Acontecimento da vinda do Salvador e a contemplar cheios de admiração a sua entrada no mundo.
A espera jubilosa, característica dos dias que precedem o Santo Natal, é certamente a atitude fundamental do cristão, que deseja viver fecundamente o renovado encontro com Aquele que vem habitar no meio de nós: Jesus Cristo, o Filho de Deus que se fez homem. Voltemos a encontrar esta disposição do coração, fazendo-a nossa, naqueles que foram os primeiros a receber a vinda do Messias: Zacarias e Isabel, os pastores, o povo simples, e especialmente Maria e José, que sentiram pessoalmente a trepidação, mas sobretudo a alegria pelo mistério deste Nascimento. Todo o Antigo Testamento constitui uma única grande promessa, que devia realizar-se com a vinda de um salvador poderoso. Disto nos dá testemunho em particular o livro do profeta Isaías, que nos fala do esforço da história e de toda a criação por uma redenção destinata a dar novas energias e renovada orientação ao mundo inteiro. Assim, além da espera dos protagonistas das Sagradas Escrituras, ao longo dos séculos encontra espaço e significado também a nossa espera, aquela que nestes dias experimentamos e que nos conserva vigilantes durante todo o caminho da nossa vida. Com efeito, toda a existência humana é animada por este profundo sentimento, pelo desejo de que quanto de mais verdadeiro, bonito e maior entrevimos e intuímos com a mente e o coração, possa vir ao nosso encontro e, diante dos nossos olhos, se torne concreto e nos eleve.
“Eis que vem o Senhor todo-poderoso: será chamado Emanuel, Deus-conosco”
Nestes dias repetimos frequentemente estas palavras. No tempo da liturgia, que volta a atualizar o Mistério, já está às portas Aquele que vem para nos salvar do pecado e da morte, Aquele que, depois da desobediência de Adão e Eva, nos reabraça e nos abre de par em par a entrada para a vida verdadeira. Explica-o Santo Irineu, no seu tratado “Contra as heresias”, quando afirma: “O próprio Filho de Deus assumiu “uma carne semelhante à do pecado” (Rm 8, 3) para condenar o pecado e, depois de o ter condenado, para o excluir completamente do gênero humano. Chamou o homem à semelhança consigo mesmo, tornou-o imitador de Deus, iniciou-o no caminho indicado pelo Pai para que pudesse ver Deus e conferiu-lhe como dom o próprio Pai” (III, 20, 2-3).
Aparecem-nos algumas ideias preferidas de santo Irineu, que Deus com o Menino Jesus nos chama à semelhança consigo mesmo. Vemos como é Deus. E assim recorda-nos que nós deveríamos ser semelhantes a Deus. E devemos imitá-lo. Deus ofereceu-se, Deus entregou-se nas nossas mãos. Temos que imitar Deus. E por fim a ideia de que assim podemos ver Deus. Uma ideia central de santo Irineu: o homem não vê Deus, não pode vê-lo, e assim está na obscuridade sobre a verdade, sobre si mesmo. Mas o homem que não pode ver Deus, pode ver Jesus. E deste modo vê Deus, assim começa a ver a verdade, começa a viver.
Portanto, o Salvador vem para reduzir à impotência a obra do mal e tudo quanto ainda nos pode manter distantes de Deus, para nos restituir ao antigo esplendor e à paternidade primitiva. Com a sua vinda ao meio de nós, Deus indica-nos e confia-nos também uma tarefa: precisamente a de ser semelhantes a Ele e de tender para a verdadeira vida, de alcançar a visão de Deus, no rosto de Cristo. Santo Irineu afirma ainda: “O Verbo de Deus pôs a sua morada no meio dos homens e fez-se Filho do homem, para habituar o homem a sentir Deus, e para habituar Deus a fazer a sua morada no homem, segundo a vontade do Pai. Por isso, Deus concedeu-nos como “sinal” da nossa salvação Aquele que, nascendo da Virgem, é o Emanuel”. Também aqui há uma ideia central muito bonita de santo Irineu: temos que nos habituar a sentir Deus. Normalmente, Deus está distante da nossa vida, das nossas ideias, do nosso agir. Aproximou-se de nós e temos que nos habituar a estar com Deus. E, audazmente, Irineu ousa dizer que também Deus deve habituar-se a estar conosco e em nós. E que talvez Deus tenha que nos acompanhar no Natal, habituar-nos a Deus, como Deus se deve habituar a nós, à nossa pobreza e fragilidade. Por isso, a vinda do Senhor não pode ter outra finalidade, a não ser a de nos ensinar a ver e a amar os acontecimentos, o mundo e quanto nos circunda, com os olhos do próprio Deus. O Verbo que se fez Menino ajuda-nos a compreender o modo de agir de Deus, a fim de sermos capazes de nos deixar transformar cada vez mais pela sua bondade e misericórdia infinita.
Na noite do mundo, deixemo-nos surpreender e iluminar de novo por este gesto de Deus, que é totalmente inesperado: Deus faz-se Menino. Deixemo-nos surpreender, iluminar pela Estrela que inundou o universo de alegria. Chegando a nós, que o Menino Jesus não nos encontre despreparados, comprometidos só em tornar mais bonita a realidade exterior. A atenção que prestamos para tornar mais resplandecentes as nossas ruas e as nossas casas nos leve, ainda mais, a predispor o nosso espírito para encontrar Aquele que virá visitar-nos, que é a verdadeira beleza e a verdadeira luz. Portanto, purifiquemos a nossa consciência e a nossa vida daquilo que é contrário a esta vinda: pensamentos, palavras, atitudes e gestos, impelindo-nos a fazer o bem e a contribuir para realizar neste nosso mundo a paz e a justiça para cada homem e assim ir ao encontro do Senhor.
Sinal característico do tempo de Natal é o presépio. O presépio é expressão da nossa expectativa, que Deus se aproxima de nós, que Jesus se aproxima de nós, mas é também expressão da ação de graças Àquele que decidiu compartilhar a nossa condição humana, na pobreza e na simplicidade. Alegro-me porque permanece viva e, aliás, se redescobre a tradição de preparar o presépio nas casas, nos postos de trabalho, nos lugares de encontro. Este testemunho genuíno de fé cristã possa oferecer também hoje a todos os homens de boa vontade um sugestivo ícone do amor infinito do Pai por todos nós. Os corações das crianças e dos adultos possam ainda surpreender-se diante dele.
Fonte: Parte da Catequese do Papa Emérito Bento XVI durante a Audiência Geral ocorrida em 22 de dezembro de 2010 em Roma