É justo e bom confiar totalmente em Deus e crer absolutamente no que Ele diz.
O Catecismo da Igreja Católica nos ensina que a fé é uma Graça, um dom de Deus. Quando Pedro confessa que Jesus é o Cristo, o Filho do Deus vivo, Jesus declara-lhe que esta revelação não lhe veio “da carne nem do sangue, mas do seu Pai que está nos Céus” (Mt 16, 17). A fé é um dom de Deus, uma virtude sobrenatural infundida por Ele. “Para prestar esta adesão da fé, são necessários a prévia e concomitante ajuda da graça divina e os interiores auxílios do Espírito Santo, o qual move e converte o coração para Deus, abre os olhos do entendimento, e dá ‘a todos a suavidade em aceitar e crer a verdade’”. Ao mesmo tempo, a fé é um ato humano, é pela fé que o homem submete completamente a Deus a inteligência e a vontade; com todo o seu ser, o homem dá assentimento a Deus.
O ato de fé só é possível pela graça e pelos auxílios interiores do Espírito Santo. Mas não é menos verdade que crer é um ato autenticamente humano. Não é contrário nem à liberdade nem à inteligência do homem confiar em Deus e aderir às verdades por Ele reveladas. Mesmo nas relações humanas, não é contrário à nossa própria dignidade acreditar no que outras pessoas nos dizem acerca de si próprias e das suas intenções, e confiar nas suas promessas (como, por exemplo, quando um homem e uma mulher se casam), para assim entrarem em mútua comunhão. Por isso, é ainda menos contrário à nossa dignidade “prestar, pela fé, submissão plena da nossa inteligência e da nossa vontade a Deus revelador” e entrar assim em comunhão íntima com Ele.
A fé faz que saboreemos, como que de antemão, a alegria e a luz da visão beatifica, fim da nossa caminhada nesta Terra. Então veremos Deus “face a face” (1Co 13, 12), “tal como Ele é” (1Jo 3, 2). A fé, portanto, é já o princípio da vida eterna:
“Enquanto, desde já, contemplamos os benefícios da fé, como reflexo num espelho, é como se possuíssemos já as maravilhas que a nossa fé nos garante havermos de gozar um dia”. Por enquanto porém, “caminhamos pela fé e não vemos claramente” (2Co 5, 7), e conhecemos Deus “como num espelho, de maneira confusa, […] imperfeita” (1Co, 13, 12). Luminosa por parte d’Aquele em quem ela crê, a fé é muitas vezes vivida na obscuridade, e pode ser posta à prova. O mundo em que vivemos parece muitas vezes bem afastado daquilo que a fé nos diz: as experiências do mal e do sofrimento, das injustiças e da morte parecem contradizer a Boa-Nova, podem abalar a fé e tornarem-se, em relação a ela, uma tentação.
É então que nos devemos voltar para as testemunhas da fé: Abraão, que acreditou, “esperando contra toda a esperança” (Rm 4, 18); a Virgem Maria que, na “peregrinação da fé”, foi até à “noite da fé”, comungando no sofrimento do seu Filho e na noite do seu sepulcro; e tantas outras testemunhas da fé: “envoltos em tamanha nuvem de testemunhas, devemos desembaraçar-nos de todo o fardo e do pecado que nos cerca, e correr com constância o risco que nos é proposto, fixando os olhos no guia da nossa fé, o qual a leva à perfeição”(Hb 12, 1-2).
O prefácio da missa de Finados (Fieis defuntos) diz: “aos que a certeza da morte entristece, a promessa da imortalidade consola”. A fé não exime os crentes da angústia de ter de morrer, mas a alivia com a esperança. Neste sentido, há um testemunho comovente que se encontra na Rússia. Em 1972, em uma revista clandestina se publicou uma oração encontrada no bolso da jaqueta do soldado Aleksander Zacepa, composta pouco antes da batalha na qual perdeu a vida na 2ª Guerra Mundial. Diz assim:

Escuta, ó Deus! Nenhuma vez em minha vida falei contigo, hoje porém, sinto vontade de fazer-te festa. Sabe desde pequenino sempre me disseram que não existes… Eu, tolo, acreditei nisso. Jamais contemplei tuas obras, mas nesta noite olhei, da cavidade de uma granada, para o céu de estrelas sobre mim e fascinado por seu cintilar, de repente compreendi como pode ser terrível o engano… Não sei, ó Deus, se irás me dar tua mão, mas eu te digo e tu me compreenderas…

Não é estranho que em meio a um pavoroso inferno me tenha aparecido a luz e tenha te avistado? Além disto, nada mais tenho a dizer-te. Estou feliz somente porque te conheci.

À meia-noite, teremos que atacar, mas não tenho medo, tu olhas sobre nós.

É o sinal! Devo partir. Estava-se bem contigo. Quero ainda dizer-te, e tu o sabes, que a batalha será árdua: pode suceder que ainda nesta noite venha a bater à tua porta. E mesmo que até agora não tenha sido teu amigo, quando eu for, irás permitir que entre?

Mas o que acontece, estou chorando?

Deus meu, tu vês o que me aconteceu, somente agora comecei a ver claro…

Salve, meu Deus, eu vou… Dificilmente voltarei.

Que estranho, agora a morte não me causa medo.

Fontes: Catecismo da Igreja Católica, parágrafos 142-164. / Pregação do Pe. Raniero Cantalamessa, OFM Cap., pregador da Casa Pontifícia, por ocasião da solenidade de todos os santos e a comemoração dos fiéis defuntos (disponível em https://www.bibliacatolica.com.br/blog/pregador-do-papa-todos-os-santos-e-fieis-defuntos/#.XHPvluhKiUl )