Na entrega de Jesus ao Pai, no seu sim, está encerrada a obediência perfeita do novo Adão. Aquele sim livre que Deus buscava desde os dias da criação, sem jamais alcança-lo nem de Adão, nem de nenhum outro, agora o obtém de Jesus. A vontade divina encontra finalmente o pleno cumprimento em uma liberdade humana. A liberdade de Jesus abarca todo o querer do Pai, há uma sintonização perfeita, um canal que se estabelece entre céu e terra e reabre o diálogo entre Deus e o homem.
Realiza-se assim a plena complacência do Pai: “o Pai me ama, porque dou a minha vida para a retomar”(Jo 10,17). A complacência de Deus que se havia interrompido no sexto dia da criação, reaparece agora sobre a terra. Ela vagava, por assim dizer, sem ter onde pousar, como a pomba saída da arca de Noé, porque a terra estava submersa pelas águas da rebelião (“as águas de Meriba”). Agora tem onde pousar e, de fato, sobre Jesus, no Jordão, pousa a pomba e com ela o Espírito Santo, que é a complacência do Pai: “Tu és o meu Filho muito amado, em ti ponho minha afeição” (Mc 1,11). Realiza-se assim a nova criação, o Pai contempla e se compraz novamente; entre o céu e a terra reaparece, como após o dilúvio, o arco-íris da aliança.
De que é que se compraz, na realidade, o Pai? Talvez do sofrimento, do sangue e da morte do Filho? Seria monstruoso pensar nisso! Compraz-se do amor que essa morte demonstra e, por assim dizer, “liberta”. “Quero o amor mais que os sacrifícios” (Os 6,6), diz Deus. O perfume não se difunde se não se rompe o vaso de alabastro que o contém, mas o que é agradável não é o vaso partido, é o perfume que está dentro. “Deus”, dizia Moisés ao povo eleito, “te humilhou e te pôs a prova para saber o que tinha no coração”: isso vale para qualquer prova que venha de Deus, também para a prova suprema do Homem-Deus, Deus prova sempre para tirar o melhor do coração do homem. E no coração de Jesus, o Deus humanado, há o desejo da salvação dos homens e do homem todo.
(Fonte: A PALAVRA E A VIDA – REFLEXÕES SOBRE A PALAVRA DE DEUS PRÓPRIA DOS DOMINGOS E DAS FESTAS DO ANO B. pág. 235. Autor, Raniero Cantalamessa.)