O Senhor Ressuscitado entra através das portas fechadas no lugar onde os discípulos se encontravam e saúda-os duas vezes dizendo: “A paz esteja convosco!” (Jo 20,19).
Abri as nossas portas e dá-nos a Paz!
Nós, continuamente, fechamos as nossas portas; continuamente, queremos pôr-nos a salvo e não ser incomodados pelos outros nem por Deus. Portanto, podemos suplicar continuamente o Senhor por isso, para que ele venha ao nosso encontro vencendo os nossos fechamentos e trazendo-nos a sua saudação. “A paz esteja convosco”: esta saudação do Senhor é uma ponte, que ele lança entre céu e terra. Ele desce por esta ponte até nós e nós podemos subir, por esta ponte de paz, até Ele. Nesta ponte, sempre juntamente com Ele, também nós devemos alcançar o próximo, alcançar aquele que tem necessidade de nós. Precisamente descendo com Cristo, nós elevamo-nos até Ele e até Deus: Deus é Amor e por isso descida, abaixamento, que o amor nos pede, e ao mesmo tempo é a verdadeira subida. Precisamente assim, abaixando-nos, saindo de nós mesmos, nós alcançamos a altura de Jesus Cristo, a verdadeira altura do ser humano.
À saudação de paz do Senhor seguem-se dois gestos decisivos para o Pentecostes: o Senhor deseja que a sua missão continue nos discípulo – “Assim como o Pai me enviou, também Eu vos envio a vós” (Jo 20, 21) e depois disto, sopra sobre eles e diz: “Recebei o Espírito Santo. Àqueles a quem perdoardes os pecados, ficarão perdoados; àqueles a quem os retiverdes, ficarão retidos” (Jo 20, 23).
“O homem é esta criatura misteriosa, que provém totalmente da terra, mas no qual foi posto o sopro de Deus”.
O Senhor sopra sobre os discípulos, e assim dá-lhes o Espírito Santo, o seu Espírito. O sopro de Jesus é o Espírito Santo. Reconhecemos aqui, antes de mais, uma alusão à narração da criação do homem no Gênesis, onde está escrito: “O Senhor Deus formou o homem do pó da terra e insuflou-lhe pelas narinas o sopro da vida” (Gn 2, 7). Jesus sopra sobre os apóstolos e dá-lhe de maneira renovada, maior, o sopro de Deus. Nos homens, não obstante todas as suas limitações, existe agora algo absolutamente novo, o sopro de Deus. A vida de Deus habita em nós. O sopro do seu amor, da sua verdade e da sua bondade. Assim podemos ver aqui também uma alusão ao batismo e à confirmação a esta nova pertença a Deus, que o Senhor nos concede. O texto do Evangelho convida-nos a isto: a viver sempre no espaço do sopro de Jesus Cristo, a receber vida d’Ele, de modo que ele inspire em nós a vida autêntica a vida da qual morte alguma pode privar.
Dissolveu nossas culpas nas chamas do amor!
Com o seu sopro, com o dom do Espírito Santo, o Senhor relaciona o poder de perdoar. O Espírito Santo une, abate as fronteiras, guia uns para os outros. A força, que abre e faz superar Babel, é a força do perdão. Jesus pode conceder o perdão e o poder de perdoar, porque ele mesmo sofreu as consequências da culpa e dissolveu-as na chama do seu amor. O perdão vem da cruz; ele transforma o mundo com o amor que nos doa. O seu coração aberto na cruz é a porta pela qual entra no mundo a graça do perdão. E unicamente esta graça pode transformar o mundo e edificar a paz.
Ressoa depois, no Evangelho, uma segunda palavra do Ressuscitado: “assim como o Pai me enviou, também Eu vos envio a vós” (Jo 20, 21).
Cristo diz isto, de modo muito pessoal, a cada um de vós. Todos nós somos inseridos na rede da obediência à palavra de Cristo, à palavra daquele que dá a verdadeira liberdade, porque nos conduz nos espaços livres e nos horizontes amplos da verdade. Precisamente neste vínculo comum com o Senhor nós podemos e devemos viver o dinamismo do Espírito. Como o Senhor saiu do Pai e nos doou luz, vida e amor, assim a missão deve continuamente pôr-nos em movimento, tornar-nos inquietos, para levar a quem sofre, a quem está em dúvida, e também a quem hesita, a alegria de Cristo. Por fim, há o poder do perdão.
O sacramento da penitência é um dos tesouros preciosos da Igreja, porque só no perdão se realiza o verdadeiro renovamento do mundo. Nada pode melhorar no mundo, se o mal não for vencido. E o mal pode ser vencido unicamente com o perdão. Sem dúvida, deve ser um perdão eficaz. Mas este perdão, só o Senhor o pode dar. Um perdão que não afasta o mal só com palavras, mas realmente o destrói. Isto pode verificar-se unicamente com o sofrimento e aconteceu realmente com o amor sofredor de Cristo, do qual nós haurimos o poder do perdão.
Por fim, recomendo-vos o amor à Mãe do Senhor. Fazei como São João, que o acolheu no íntimo do próprio coração. Deixai-vos renovar continuamente pelo seu amor materno. Aprendei dela a amar Cristo. O Senhor abençoe o vosso caminho! Amém.
Fonte: Parte da homilia do Papa Bento XVI durante a Concelebração Eucarística para a Ordenação de 21 Sacerdotes na Solenidade de Pentecostes (Domingo, 15 de Maio de 2005)