Provavelmente no ano 52, São Paulo escreveu a primeira das suas cartas, a primeira Carta aos Tessalonicenses, na qual fala deste regresso de Jesus, chamado parusia, advento, nova, definitiva e manifesta presença (cf. 4, 13-18). Aos Tessalonicenses, que têm dúvidas e problemas, o Apóstolo escreve assim: “Se cremos que Jesus morreu e ressuscitou, assim também os que morreram em Jesus, Deus há de levá-los em sua companhia” (4, 14). E prossegue: “em seguida nós, os vivos que estiverem lá, seremos arrebatados com eles nas nuvens para o encontro com o Senhor, nos ares. E assim, estaremos para sempre com o Senhor” (4, 16-17). Paulo descreve a parusia de Cristo com tonalidades vivas como nunca e com imagens simbólicas, que contudo transmitem uma mensagem simples e profunda: o nosso futuro é “estar com o Senhor”; como crentes, na nossa vida já estamos com o Senhor; o nosso futuro, a vida eterna, já começou.
Trabalhem na tranquilidade
Na segunda Carta aos Tessalonicenses Paulo muda de perspectiva; fala de acontecimentos negativos, que deverão preceder o final e conclusivo. Não nos devemos deixar enganar diz como se o dia do Senhor fosse deveras iminente, segundo um cálculo cronológico: “Quanto à vinda de Nosso Senhor Jesus Cristo, e à nossa reunião com ele, rogamo-vos, irmãos, que não percais tão depressa a serenidade de espírito, e não vos perturbeis nem por palavra profética, nem por carta que se diga vir de nós, como se o dia do Senhor já estivesse próximo. Não vos deixeis enganar de modo algum!” (2, 1-3). A continuação deste texto anuncia que antes da vinda do Senhor haverá a apostasia e deverá ser revelado um não bem identificado “homem iníquo”(2, 3), que a tradição chamará depois o Anticristo. Mas a intenção desta Carta de São Paulo é antes de tudo prática; ele escreve: “Quando estávamos entre vós, já vos demos esta ordem: quem não quer trabalhar também não há de comer. Ora, ouvimos dizer que alguns dentre vós levam vida à-toa, muito atarefados sem nada fazer. A estas pessoas ordenamos e exortamos, no Senhor Jesus Cristo, que trabalhem na tranquilidade, para ganhar o pão com o próprio esforço” (3, 10-12). Noutras palavras, a expectativa da parusia de Jesus não dispensa do compromisso neste mundo, mas ao contrário, cria responsabilidade face ao Juiz divino acerca do nosso agir neste mundo.
Viver para os outros
A mesma coisa e o mesmo nexo entre parusia vinda do Juiz Salvador e o nosso compromisso na vida aparece noutro contexto e com novos aspectos na Carta aos Filipenses. Paulo está na prisão e espera a sentença que pode ser de condenação à morte. Nesta situação pensa no seu futuro estar com o Senhor, mas pensa também na comunidade de Filipos que tem necessidade do próprio pai, de Paulo, e escreve: “Pois para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro. Mas, se o viver na carne me dá ocasião de trabalho frutífero, não sei bem o que escolher. Sinto-me num dilema: o meu desejo é partir e estar com Cristo, pois isso me é muito melhor, mas o permanecer na carne é mais necessário por vossa causa. Convencido disso sei que ficarei e continuarei com todos vós, para proveito vosso e para alegria da vossa fé, a fim de que, por mim pelo meu regresso entre vós aumente a vossa glória em Cristo Jesus” (1, 21-26).
Paulo não tem medo da morte, ao contrário: de fato ela indica o ser completo com Cristo. Mas Paulo participa também dos sentimentos de Cristo, o qual não viveu para si, mas para nós. Viver para os outros torna-se o programa da sua vida e por isso demonstra a sua perfeita disponibilidade à vontade de Deus, ao que Deus decidir. É disponível sobretudo, também no futuro, a viver nesta terra para os outros, a viver para Cristo, a viver para a sua presença viva e assim pela renovação do mundo. Vemos que este seu ser com Cristo gera uma grande liberdade interior: liberdade diante da ameaça da morte, mas liberdade também diante de todos os compromissos e sofrimentos da vida. Está simplesmente disponível para Deus e é realmente livre.
Fonte: Parte do discurso do Papa Emérito Bento XVI, por ocasião de uma Audiência Geral, ocorrida na Praça São Pedro em Roma em 12 de novembro de 2008.